Por Erica Ferreira
Quantos de vocês leitores já foram a um restaurante, bar ou hotel, almoçar ou jantar e deram de caras com um menu completo, com nomes mais ou menos fantasistas (“Esferificação”), com mais ou menos ingredientes, e um prato que realmente despertou a vossa curiosidade, o vosso apetite?
Em Angola, a cena acontece quase sempre assim:
– Boa tarde, eu sou o Manel e vou vos atender hoje.
– Boa tarde!
– Posso recolher os vossos pedidos?
Encantados de ver este homem salvar-vos da vossa fome, respondem com entusiasmo:
– Simmm! Eu quero o estufado de entrecôte com acelga salteada, suspiro de bacon e génoise de funcho.
– E para beber?
– Limonada de frutos vermelhos e pitaya, com bastante gelo por favor.
Enquanto isso, mergulham no cestinho de pão endiabrado que vocês não precisam mas “são só 2 pedacinhos para enganar a fome. É que o pão está mesmo quente e com esta manteiga, uhm…”
Cinco pedaços de pão com manteiga depois, vem o empregado com um ar comprometido:
– Peço desculpa, é que já não temos funcho.
Decepcionados, retorquem:
– Ahhh que pena… tá bem… pode vir mesmo assim.
Passam-se mais 2 pedacinhos, vem a limonada de frutos vermelhos e pitaya. Chamam o garçom novamente:
– Olhe, por favor, a minha limonada só sabe a pitaya.
– Pois, é que estamos sem frutos vermelhos.
– Mas têm que avisar…
Mais quatro pedacinhos de pão (já equivalente a um pão) e três azeitonas mais tarde:
– Pedimos imensas desculpas mas o chefe pediu para informar que o prato não poderá sair pois não tem funcho e também não encontramos entrecôte.
Conformados, dizem:
– Traga-me o menu então.
Peparado pela repetição diária destas situações, o bom empregado de mesa já veio dar esta notícia com o menu debaixo do braço:
– Aqui tem.
Vinte pedaços de pão que já está frio com manteiga que já não derrete mais tarde, escolhemos um prato que a enchente dos trabalhadores afamados terminou e deveria ter sido riscado do menu.
Optamos finalmente pelo bitoque. O bitoque quase nunca decepciona. O bitoque salva a nossa fome e a nossa frustração. O bitoque é o nosso porto seguro.
Restaurantes, libertem-se!
Libertem-se do papel. Usem antes um quadro de giz.
Libertem-se do preconceito do menu.
Libertem-se da complexidade dos ingredientes importados.
Libertem-se da obrigação da rotina.
Libertem-se do tédio da cozinha. Inovem, mas com o que têm. Porque inovar com ingredientes que não existem no mercado cria frustração, maus reviews no LNL, baixa os níveis de exigência dos clientes e não contribui em nada para a indústria do turismo e da restauração do país.
Restaurantes, libertem-se!
Criem menus semanais (ou diários) com o que a senhora vos trouxe do mercado, com o que os vossos fazendeiros vos entregaram. Façam menus realmente criativos, frescos, diferentes e autênticos. Aprendam novas técnicas. Façam novas misturas. Testem-se. Cozinhem com o que o pescador vos trouxe e com o que já saiu do contentor, não o que ainda estão à espera de desalfandegar. Simplifiquem-se. Ajudem-se. Facilitem-se. Só escrevam no papel o que sabem que não falha.
Não pensem que só voltamos por causa do prato que comemos uma vez. Nós voltamos por causa do serviço irrepreensível, por causa da energia, por causa da simpatia do gerente e por causa da boa companhia. Voltamos porque sabemos que naquele restaurante, não nos vamos frustrar.
E clientes, comecem sempre por perguntar ao garçom “o quê que não há?”